Segunda-feira, 19.05.08 - Ano II - Edição Número 264

Mais uma vez peço desculpas ao estimado público leitor pelo espaçamento na publicação de novas edições. Afazeres profissionais limitam o exíguo tempo. Bem, mas voltamos à trincheira...
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QUEM GRAVOU?
A semana encerrou com a enigmática sugestão do governador Marcelo Déda a Edvaldo Nogueira para processar judicialmente aliados do senador Almeida Lima, acusados pelo deputado federal Jackson Barreto de pichar muros e paredes em Aracaju com “frases desabonadoras à imagem” do prefeito comunista. Tudo começou terça-feira, no programa do radialista-deputado tampão Gilmar Carvalho. Jackson Barreto disse ter em mãos gravação com o ex-vereador Marcélio Bomfim, assessor de Almeida Lima, comandando pichadores e alertando para não falarem no nome do senador, caso fossem pegos em flagrante. As pichações com a frase “Fora dengue, fora Edvaldo” apareceram na semana retrasada, na madrugada da quinta-feira. Para Jackson Barreto, “a campanha nem começou e a baixaria já corre solta”. Sobre baixarias em campanhas eleitorais – e também, antes e depois delas –, o nobre deputado, cujo histórico judicial tem quase cinco quilômetros de extensão, é catedrático. O hoje sexagenário Jackson Barreto, talvez em respeito às madeixas brancas tingidas de acaju, não negou as delinqüências da juventude. Ele contou a Gilmar Carvalho, vertendo as homéricas e onipresentes lágrimas de crocodilo, sua epopéia como pichador. Àquela época, pichava-se por uma causa justa: derrubar a ditadura! Jackson Barreto, contudo, não encerrou a carreira de pichador com o fim da ditadura, como fez crer no programa do Cão-Cão. Preceptor de toda uma geração de grandes pichadores de esquerda, o deputado deu continuidade ao uso indiscriminado da pichação como instrumento covarde para achincalhes virulentos contra a honra e a moral dos adversários também no período democrático. Jackson Barreto, inclusive, tinha cuidados especiais com sua trupe de elite de pichadores de alta confiança. Batizou um deles, o ex-vereador Luis Carlos dos Santos, com a sugestiva alcunha de Branca de Neve, para despistar a Polícia. Negro, forte e alto, Branca de Neve passava incólume pelos policiais, que procuravam “o cara branco e franzino”. Marcélio Bomfim foi colega de pichação de Jackson Barreto, Marcelo Déda, Edvaldo Nogueira e de uma centena de outros vanguardistas da esquerda sergipana, especialistas em borrar muros e paredes. Um dos mais lendários causos, sempre rememorado quando os mestres da pichação têm encontros etílicos para enaltecer o passado glorioso, conta da “timidez” de Marcelo Déda. Na hora de pegar na brocha para pichar a antológica frase “Abaixo a ditadura!”, o esgalgado estudante de Direito sempre dava um jeitinho de escapar de fininho – quem era preso, invariavelmente tomava uns tabefes. A obscura atitude de Marcelo Déda de induzir o prefeito comunista a pedir ao Judiciário para punir os pichadores de hoje revela um interessante sintoma de “autismo seletivo”. Para ele, a percepção da (real) realidade é apenas a que lhe convém. Marcelo Déda, de fato, deveria mandar descobrir o verdadeiro criminoso de toda essa pendenga. Afinal, quem invadiu a reunião do PMDB e gravou clandestinamente todas as conversas tratadas e em seguida repassou a fita gravada – graciosamente ou recebendo algum provento – a um político adversário do grupo pichador? O precedente é perigoso! A SSP precisa urgentemente investigar – e descobrir, claro! – quem é o autor das gravações, quem mandou gravar e se houve transação comercial das informações (a fita em si), cujo teor, apesar de risível, expõe as entranhas do modus operandi de uma entidade de direito público supostamente inviolável. Estaríamos diante de um PMDBgate? Jackson Barreto e Marcélio Bomfim tiveram a vida esmiuçada pela ditadura. Ambos sofreram o horror do confronto direto com um regime de exceção arbitrário. O deputado diz que parou de pichar. O assessor foi flagrado ordenando pichações. A grande diferença é que a bisbilhotice de agora acontece num ambiente de suposta democracia! Lamentável, porém, é que um chefe de Governo esteja mais preocupado em garantir punição a quem pichou a hilária “Fora dengue, Fora Edvaldo” do que por investigar quem é o canalha que anda gravando as reuniões políticas alheias. Mesmo sendo um “advogado chumbrega” (conforme foi definido pelo compadre-presidente Lula da Silva), Marcelo Déda deve conhecer minimamente de leis. Sabe não ter havido crime na pichação. Mas há um crime que Marcelo Déda pode contribuir para elucidar, por ter o instrumental necessário. Daria, por conseguinte, grande contribuição à manutenção do Estado de Direito e à prerrogativa constitucional da privacidade. Afinal governador, dá para mandar saber quem gravou a reunião?

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