Sábado, 29 de Agosto de 2009 – 22h55

O Tempo, Senhor da Razão

Quando tudo apenas começava, ainda nos cem dias de governo, diante das primeiras cobranças da promessa de fazer de Sergipe o Céu na Terra, Marcelo Déda e sua trupe mantiveram uma única cantilena: se nada fora feito até então, a culpa era de quem havia saído.

A desculpa inicial: a da casa desarrumada. Seria preciso muito esforço e capacidade de administrar crises para por Sergipe em ordem. Os ataques contra João Alves Filho, acusado de ser o único responsável por todas as mazelas e erros do novo governo, marcaram o ano de 2007.

Durante 2008, a cantiga “O Culpado é o Ex” ganhou uma nova versão. Os servidores passaram a ser acusados de conspirar contra o “projeto de mudança”. Alguns poucos segmentos da imprensa também foram agregados ao rol dos lacaios. Se o governador acordava ainda meio tonto da refrega da noite anterior, a culpa era... Se o penteado da secretária Eloísa Galdino desamaciava, a culpa era... Se o deputado Francisco Gualberto não encontrava seu facão devidamente afiado, a culpa era...

O terceiro ano do “projeto de mudança” certamente deveria trazer alguma mudança para valer. Trouxe! Confrontado com o fato de não ter uma única ação de monta executada ou obras importantes entregues, Marcelo Déda trocou uns três secretários no início do 2009 e foi conhecer o sertão, onde deu início à maratona de inaugurações, com comícios trecho a trecho, da “Rota do Sertão”.

Enquanto o governador estava nos palanques sertanejos a falar mal dos adversários, o couro comia nele em Aracaju. Todo o plantel de “ratos de rádio”, pagos pela Secretaria Estadual de Comunicação para defender Marcelo Déda, foi insuficiente para conter a onda de reclamações feitas diretamente pelo povo.

O governador das mudanças para pior reagiu como sempre. Fez surgir um novo culpado pela sua lerdeza, anunciado com pompa pelo homem do facão: “Politicamente, nosso governo está pagando um preço caro com a paralisação de algumas obras e demora na conclusão de outras, mas é uma opção nossa. Entre o prejuízo político de ter uma obra atrasada e se submeter a chantagens para botar dinheiro público no bolso de empresários, o governador Marcelo Déda opta por preservar o dinheiro do povo”.

Resumo da ópera: se o governo do PT chegou a mais de dois anos e meio de mandato de modo chumbrega, para recordar a palavra usada pelo compadre-presidente Lula da Silva ao definir o próprio governador, a culpa não é de Marcelo Déda e sua trupe.

No que se conclui: o neófito governador é um homem santo, perseguido e martirizado pelo fantasma do ex-governo de João Alves Filho. Marcelo Déda seria a vítima desvalida de uma poderosa conspiração, cujo objetivo é prejudicar seu governo, com métodos típicos de uma “tortura moral”.

Culpar terceiros pelos próprios erros é a saída comum dos oportunistas. As promessas de fazer de Sergipe o Céu na Terra foram esquecidas por quem as recitou como versos irrevogáveis nos palanques de 2006. Mas como admitiu o próprio “Número Um”, ele não é divino para fazer milagres...

Na oposição, Marcelo Déda sabia apontar defeitos alheios como nenhum outro. De posse do Diário Oficial, o governador virou só lamúrias e sofreguidão, que busca dividir alhures como se não lhe fossem sujeições exclusivas.

Sobra o consolo de ser o Tempo senhor da razão!

Quarta-feira, 26 de Agosto de 2009 – 16h15

O Que Tem a Ver o Respectivo Com as Calças?

A mais requentada discussão política dos últimos dias é quanto a quem chegou primeiro ao mundo, se o ovo ou a galinha. Importaria ao distinto público conhecer o “verdadeiro” autor da ação em tramitação no TSE, com a acusação de abuso da máquina pública e outros ilícitos, perpetrada contra o governador Marcelo Déda?

Sim! Importa, e muito. Pois sem um autor, ou mentor se preferirem, devidamente identificado, com peso político obviamente, a futura canonização de Marcelo Déda, condenado ou não na querela do TSE, ficaria sem a “agravante eleitoreira”, e daí não poderia ser usada com a mesma eficácia nos palanques.

Se a dita ação tivesse a autoria de Maria Candelária, a “puta velha cansada de guerra, mas que um dia foi uma formosura na flor nem sempre pura da idade”, conforme os vívidos versos de Armando Rafael*, não haveria qualquer mínimo reboliço. Seria apenas uma “mulher da vida” a conjurar fábulas. Mas...

Os fatos – Tudo começou com a cantilena de Marcelo Déda ao Cinform desta semana, na qual acusa João Alves Filho de ser “o sujeito oculto de um golpe que não terá o apoio do TSE”. Na mesma reportagem, o ex-governador negou qualquer envolvimento: “A cassação de Marcelo Déda não me interessa. Seja qual for a decisão, não quero assumir o governo. Eu quero ganhar do governador no voto”.

Ainda na segunda-feira, Marcelo Déda fez chegar ao Jornal do Dia “cópias de documentos com a comprovação da participação do ex-governador no processo”. Ontem pela manhã os tais “documentos” foram disponibilizados no e-Sergipe**, o blog da Secretaria Estadual de Comunicação.

De acordo com o texto de apresentação da papelada, “João Alves Filho pede para ingressar como assistente litisconsorcial na representação contra o governador. A assistência litisconsorcial é um meio legítimo de participação onde o assistente atua no processo por ter interesse em que a sentença lhe seja favorável, pois sua situação jurídica será diretamente atingida pelos efeitos da sentença proferida”.

Trocando em miúdos, conforme “explicou” o Diário Oficial do governo das mudanças para pior, o Jornal do Dia: “A petição obtida com exclusividade pelo Jornal do Dia joga por terra o discurso do ex-governador João Alves Filho de que não moveu ‘nenhuma palha sequer’ no processo que tramita no TSE pedindo a cassação do diploma do governador Marcelo Déda”.

O canto suave da “pobre vítima vilipendiada e atacada pela elite dominante, do sempre ético, do incorruptível e do divinamente honesto” estava então reabilitado. Mas...

A reação – Ontem à tarde a assessoria de João Alves Filho encaminhou à imprensa um comunicado de desmentido –pelo menos, um desmentido em parte. Diz a nota*** (resumo):

“O recurso na justiça eleitoral contra a expedição do diploma de Marcelo Deda e Belivaldo Chagas foi protocolado em dezembro de 2006 e tramitou até fevereiro de 2009 sob a responsabilidade do Partido dos Aposentados da Nação – PAN, sem qualquer interferência do Partido Democratas.

Somente em fevereiro de 2009 –ou seja, quase três anos após o início do processo referido– o Democratas se limitou a pedir o seu ingresso na condição de assistente do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), atual autor da ação por ter sucedido o PAN. Tal decisão foi motivada pelo fato do PTB ter solicitado a extinção do feito, em 28 de janeiro de 2009, ocasião em que a Executiva Nacional do Democratas concluiu que essa desistência poderia fomentar grande injustiça.

Ocorre que a petição na qual requeri o ingresso no feito sequer foi apreciada, pois face à manifestação do Ministério Público Federal no dia 17 de agosto de 2009, emitindo o parecer de que ‘a desistência manifestada pelo recorrente não implicaria a extinção do feito sem resolução do mérito, tendo em vista a natureza eminentemente pública da matéria’, a denotar a gravidade das denúncias, solicitei já no dia 19 de agosto de 2009, antes mesmo da avaliação da referida petição, a sua desconsideração.”

(João Alves Filho)

Lá se foi para o brejo, de novo, o discurso-feito, a cantilena monótona e insossa do governador Marcelo Déda...

Mas afinal, o que tem a ver o respectivo com as calças? Diante da gravidade das denúncias (vide escritos anteriores, logo abaixo), não importa conhecer o verdadeiro autor por trás da ação nem sua motivação. O que realmente pesa é como o TSE vai se pronunciar, pois os flagrantes ilícitos ainda não foram esquecidos, como pretende o governador ao promover toda essa cortina de fumaça.

Já comentei a respeito antes e repito. O ideal para o processo político e democrático seria a disputa no voto a voto, com o governador enfrentando João Alves Filho em 2010. Todavia, no meio do caminho há um imenso pedregulho que não pode ser simplesmente ignorado.

Marcelo Déda tem uma forma, digamos, peculiar de usar a máquina na autopromoção para lucrar eleitoralmente. O megacomício de 15 dias atrás, conforme denunciei em escritos anteriores (que podem ser acessados logo abaixo), leva a crer que Ele sempre teve pia certeza da impunidade. Diante do nefasto passado de ilicitudes, agora questionado na justiça eleitoral, o governador anda muito nervoso, porquanto, esperto como é, sabe do imenso risco que corre de perder o suado mandato de forma pateticamente inusitada. Isso de um lado...

Já pelo outro, toda essa balbúrdia em torno do autor da contenda jurídica agita os partidários e admiradores sem vínculo político de João Alves Filho, que cada vez mais o enxergam como a melhor alternativa –talvez a única– de derrotar fragorosamente o saturado projeto de mudança no voto a voto. Isso sim deveria ser motivo para Marcelo Déda pensar duas vezes antes de polemizar com o ex-governador...

Mas ainda é cedo para falar em eleição.

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(*) Texto completo em http://cariricult.blogspot.com/2009/03/maria-candelaria.html.

(**) Texto completo em http://esergipe.wordpress.com/2009/08/25/documentos-comprovam-participacao-de-joao-alves-no-processo-contra-deda.

(***) Texto complexo em http://www.jornaldacidade.net/2008/noticia.php?id=40589#T+.

Segunda-feira, 24 de Agosto de 2009 – 23h35

O Discurso-Feito de Marcelo Déda

Como diria o admirador de Fidel Castro, Chico Buarque de Holanda, “de muito gorda, a porca já não anda”. Os argumentos do governador Marcelo Déda para justificar-se dos ilícitos dos quais é acusado no TSE (leia sobre no escrito anterior, logo abaixo) soam preguiçosos e patéticos.

Aliás, a incrível desfaçatez e a imensa cara-de-pau só são sobrepujadas pelos escritos dos que deveriam praticar o jornalismo com independência e imparcialidade.

Conforme disse anteriormente, caso seja cassado pelo TSE, Marcelo Deda já tem pronto o discurso do perseguido, do injustiçado; do coitadinho, vítima de um golpe rasteiro daqueles que não se conformaram com sua vitória...

Convenhamos, um homem do suposto calibre intelectual do governador das mudanças para pior, cujo poético vernáculo –dizem as más línguas– encanta até “serpentes”, bem que poderia se acercar de objeções mais modernosamente elaboradas.

A lorota da pobre vítima vilipendiada e atacada pela elite dominante, do sempre ético, do incorruptível e do divinamente honesto, é a mesmíssima usada pelo probo Jackson Barreto 20 anos atrás, quando foi desalojado da cadeira de prefeito de Aracaju (contando inclusive com o voto do então deputado estadual Marcelo Déda) sob a acusação de fazer contas à moda do cantor de forró: “Uma pra mim, uma pra tu, uma pra mim, outra pra mim!”.

Não que se possa comparar o governador a Jackson Barreto, cuja ficha corrida, se emendada folha após folha, somaria uns cinco quilômetros...

Vejam só o que disse Marcelo Déda na terça-feira 18/08, numa carta ao jornalista Luis Nassif*, proprietário de um blog mantido com recursos do BNDES:

Nassif:

Não pretendia me pronunciar, deixando aos meus advogados essa tarefa, mas, admirador do seu blog, fui lendo os comentários e julguei importante emitir algumas considerações e passar algumas informações que podem esclarecer melhor os fatos...

A acusação que me fazem decorre de atos de inauguração de obras e serviços da PREFEITURA (atente bem para o detalhe), durante o mês de MARÇO, aniversário da cidade (tradição antiga), quando eu AINDA ESTAVA NO EXERCÍCIO PLENO DO CARGO DE PREFEITO (guardem mais esse detalhe). Tudo aconteceu antes que eu fosse registrado candidato pelo PT e aceito pelos demais partidos da coligação.

Não sou acusado de compra de voto. Não me atribuem nenhum ato, durante o processo eleitoral propriamente dito, que só iniciou em JULHO. Não me acusam sequer de ter pregado um cartaz na parede de uma igreja!

Vejam bem: sou acusado de em MARÇO, quando era prefeito, de ter inaugurado obras e os atos de inaugurações terem influenciado o resultado do pleito em OUTUBRO. (...) Como poderiam festas cívicas do aniversário de Aracaju, ou inaugurações festivas, como tradicionalmente se faz aqui, realizadas em março terem tanta força, a ponto de, em outubro, configurarem abuso contra um candidato que disputou reeleição no cargo? (Marcelo Déda)

Vejam o que escreveu Diógenes Brayner em “Plenário” (Correio de Sergipe) na quinta-feira 20/08:

“(Marcelo) Déda não é acusado de compra de voto. Não é acusado de ter usado serviços públicos ou programas e projetos sociais para captar votos. Não é acusado de usar a máquina para constranger o eleitor. Não o acusam (no processo de cassação em curso no TSE) de ter cometido qualquer outro deslize eleitoral, durante a campanha! Ou seja, não lhe atribuem, enquanto candidato, nenhum ato supostamente desabonador, durante o processo eleitoral propriamente dito, que só se iniciou, como todos sabem, em julho de 2006. (...) O governador Marcelo Déda está sendo acusando pelo fato de, em março, quando era prefeito, ter cumprido com a tarefa de qualquer chefe de executivo municipal, estadual ou federal, ou seja, de ter inaugurado obras. Tudo isso baseado na tese de que os atos de inauguração realizados em março, na capital, teriam influenciado o resultado de um pleito acontecido em outubro, nos 75 municípios do estado.”

E agora o que disse o próprio Marcelo Déda em entrevista de página inteira publicada no Cinform de hoje:

“Não sou acusado de compra de voto. Não sou acusado de ter usado serviços públicos ou programas e projetos sociais para captar votos. Não sou acusado de usar a máquina para constranger o eleitor. Não me acusam sequer de ter pregado um cartaz na parede de uma igreja durante a campanha! Não me atribuem nenhum ato ilegal durante o processo eleitoral propriamente dito, que só se iniciou em julho de 2006. (...) Acusam-se de ter feito aquilo que é obrigação do todo prefeito: inaugura obras. Aqui em Sergipe e no Nordeste é uma tradição inaugurar obras festivamente.”

Incrível a semelhança entre discursos pronunciados em fóruns distintos e em dias alternados. Podemos assim supor, tratar-se da “comunicação política” urdida por Marcelo Déda para o gran finale: ser ovacionado em praça pública na hipótese de sua vitória no TSE, ou desagravado pela camarilha aboletada na imprensa se for cassado.

Notícia é notícia e a verdade, queira a imprensa petista ou não, acaba sempre por aparecer. A população aos poucos começa a sentir as manobras dos valhacoutos e a descreditar seus escritos.

E mais: já é notável o número de eleitores que se cansaram do “projeto de mudança”. Sinceramente, o melhor seria a disputa entre os próceres (Marcelo Déda e João Alves Filho) nas urnas. O voto a voto é sempre muito mais quente... Mas se for cassado, Marcelo Déda certamente posará de vítima. Contra esse tipo de argumento é que se deve manter os olhos e ouvidos bem abertos.

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(*) (texto completo em:

http://colunistas.ig.com.br/luisnassif/2009/08/18/o-tapetao-eleitoral/)