..

Domingo, 29/05/2011 | 08h55
A celebridade Araripe Coutinho
..
Lírica
Quem se lembraria
de trazer-me um pêssego
numa tarde de angustia?
Araripe Coutinho in “Amor sem Rosto”; 1990 (Fundação Estadual de Cultura)
..
A imagem de Sergipe na semana que findou esteve associada nacionalmente ao poeta nativo Araripe Coutinho. De forma abrangente, fotos dele em poses desnudas, produzidas no hoje Palácio-Museu Olímpio Campos, foram exibidas ao Brasil através de inúmeras reportagens em meios múltiplos, vindo a fechar o ciclo a coluna “Panorama”, da revista Veja, a mais lida no país.
O próprio poeta tratou de resumir a ânsia da mídia por desqualificar sua “arte”: “Se fosse um marombado, tudo bem! Mas trata-se de um nordestino, baixinho, gay, gordo e preto. É puro preconceito.” Será? Em “Nação de homens nus”, um retrato de Araripe Coutinho ilustra em Veja como “somos literais e despojados de qualquer conceito”, na opinião da revista.
Raros são os texto assinados por Mário Sabino em Veja (foto abaixo). Redator-chefe da publicação, talvez incontido diante do inusitado repasto, tratou ele próprio de rebuscar alguma explicação àquela “arte” cujo fito, segundo o poeta, seria “promover a poesia de Araripe Coutinho, ainda majoritariamente desconhecida dos sergipanos” – e, certamente, dos demais brasileiros.
Comparada por Mário Sabino à Maja Desnuda – obra conceitual do espanhol Francisco Goya, em exibição no Museu do Prado em Madrid, e tema do filme “La Maja Desnuda” (1958) de Henry koster, com Ava Gardner no papel principal –, a “arte” de Araripe Coutinho é destroçada pelo sarcasmo que escândalos do porte costumam provocar em espíritos, digamos, mais desprevenidos.
Do alto da socrática sapiência dos viventes do Sudeste do Brasil, Mário Sabino ignora o existir da poesia do carioca Araripe Coutinho, e talvez nem a pretenda conhecer. Contudo, sacramenta o jornalista: “Literais como somos” – nós, os latino-americanos, “em geral” –, “vamos conceder que, a julgar pelos quilos a mais, Araripe Coutinho tem mesmo muito a dizer.” Seria ele assim, um “vale quanto pesa!”
O poeta conseguiu o feito memorável. Ao despir-se dos tais “conceitos” citados por Mário Sabino e, literalmente, garimpar com o próprio corpo, robusto e roliço, o que chama de “promoção da arte”, da poesia que escreve, despertou o Brasil para si... Além da mídia gratuita, diz-se de agenda lotada para entrevistas com gente famosa. Promoção maior não há!
Sobre o poeta-celebridade, disse a onírica escritora e poeta campineira Hilda Hilst, autora de excitantes elucubrações onanistas: “Diante da selvageria, do pânico, da desordem, só resta a poesia de Araripe Coutinho (...) tão jovem, mas Poeta Maior, (que) dilata de significados o meu dia.”
Sem dúvida, ela o conhecia...
Ilustração captada do/no meu IPad: "conceitual".

Um comentário:

Marcos Vinicius disse...

"Do alto da socrática sapiência dos viventes do Sudeste do Brasil, Mário Sabino ignora o existir da poesia do carioca Araripe Coutinho, e talvez nem a pretenda conhecer. Contudo, sacramenta o jornalista: “Literais como somos” – nós, os latino-americanos, “em geral” –, “vamos conceder que, a julgar pelos quilos a mais, Araripe Coutinho tem mesmo muito a dizer.”"

Ai, ai...mais adolescência existencial sergipana. Os argentinos do belo nordeste. Daí talvez a homenagem ao time portenho das divisões do futebol local. Mas adoro. Mesmo quando o garçon demora uma hora para matar minha socrática fome, ou o motorista de taxi - caricaristicamente - tenta me dar um passa moleque, num tour de gerico bêbado.
Vamos crescer gente, vamos crescer e sair da casa da mamãe.